Barragem gigante está a ser construída na região do vinho do Porto, em Portugal

No resto da Europa, a construção de grandes centrais hidroelétricas foi praticamente abandonada

 

Helsingin Sanomat – 21 Nov 2014 (notícia original, em Finlandês)

 

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À chegada às vinhas pertencentes à família Symington, uma das casas de vinho de maior prestígio Mundial, observa-se uma paisagem aterradora.

Cerca de mil operários trabalham no local da construção de uma barragem no vale do Rio Douro, onde este se encontra com o rio Tua. Grandes pedaços de rocha têm vindo a ser escavados ao longo das várias centenas de metros de altura da parede da barragem. Maquinaria pesada opera nas estradas ventosas.

“O local de construção é gigantesco e horrível”, condena Paul Symington, o patriarca da família Symington.

O Governo português decidiu armazenar o poder do encaixado vale do rio Tua para produção eléctrica. A central hidroelétrica será construída parcialmente na tradicional região produtora de vinho do alto Douro, classificada como património mundial da UNESCO.

A barragem, conhecida como Foz-Tua, deve estar pronta num prazo de dois anos. A barragem está integrada no Plano Nacional de Barragens, no qual 10 grandes centrais hidroelétricas estão planeadas ou em construção, até 2020 [nota do tradutor: No Plano inicial estava prevista  a construção de 10 barragens. Alguns locais ficaram sem interessados e um deles, Padroselos, no rio Beça, foi chumbado pelo Ministério do Ambiente. Neste momento, fazem parte do Plano sete barragens: Foz-Tua (rio Tua), Fridão, Alto Tâmega/Vidago, Daivões (rio Tâmega), Gouvães (rio Louredo), Girabolhos (rio Mondego) e Alvito (rio Ocreza) ]. Barragens destas dimensões são exceções na União Europeia, como explica Peter Lund, da Universidade Aalto de Helsínquia.

“A construção de centrais hidroelétricas de grande escala já foi descontinuada nas democracias da Europa ocidental devido às preocupações ambientais e dos usos do solo. As grandes barragens, nos dias de hoje, são construídas geralmente em países em desenvolvimento, nos quais a produção de energia começa do zero”, refere Lund, especialista em políticas energéticas.

A barragem de Foz Tua está a ser construída numa região conhecida pelo seu vinho do porto. Quando produtores de renome descobriram a construção, começaram, em conjunto com organizações ambientais, a exercer pressão sobre o Governo e sobre a UNESCO, de forma a cancelar o contrato. Ameaças da UNESCO pararam a construção por 10 meses, mas há cerca de um ano foi conseguida a permissão para continuar. “É um infortúnio muito grande”, diz Paul Symington.

Os Symingtons dominam um terço do mercado mundial de vinho do Porto. As áreas chave de produção datam de 1700 e estão dispersas ao largo das colinas que ladeiam o Tua. As encostas de grandes declives são usadas para cultivar as uvas usadas no vinho do Porto da marca Graham’s.

Alguns dos oponentes à construção  da barragem temem que o lago artificial que se formará a montante da barragem possa ameaçar o delicado micro-clima da região e expor as vinhas a doenças fúngicas. Os Symingtons, no entanto, não acreditam que haja suporte científico nestas afirmações.

“Nós estamos preocupados com o ambiente. Caminho muitas vezes pelo vale do Tua, que considerado uma das zonas mais bonitas do Mundo. Vai ficar coberto de água. E quão destrutivo para o local de Património Mundial vai ser ter uma horrível parede de cimento com cabos de alta tensão a atravessá-la.”, argumenta Paul Symington.

Se Portugal é a exceção na UE, outros ainda acreditam na produção hidroelétrica. Fora da UE, mais de 500 centrais estão planeadas para os Balcãs. Os rios da pobre Albânia, por exemplo, estão a ser emparedados com o apoio de empréstimos do Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento e do Banco Mundial.

Portugal também empobreceu dramaticamente nos últimos anos devido a valores de dívida demasiado elevados. O Ministro do Ambiente e Energia justifica o crescimento da energia hidroeléctrica com um aumento da auto-suficiência e poupanças. Portugal tem que importar grandes quantidades de petróleo. Quanto menos depender dele para electricidade, mais baixas as emissões de carbono.

A Energia Eólica, por outro lado,  já é responsável por um quarto da produção de eletricidade em Portugal. “Portugal tem que ser felicitado por isto. Dos países da UE, apenas a Dinamarca supera estes valores”, aponta Lund.

Mas quanto mais forte o vento sopra, mais barata fica a eletricidade para os consumidores e as receitas das grandes companhias energéticas ficam reduzidas. As companhias de energia hidroeléctrica conseguirão manter os lucros altos, acredita o Professor Finlandês.

Para este país em crise, os investimentos são importantes. Portugal recebeu, por parte das companhias de energia, cerca de 635 milhões de euros em pagamentos adiantados para obtenção de licenças. Estes fundos foram usados para abater o défice do orçamento.

Para além da crise, a China também tem influência nos “bastidores”. A maior empresa de Portugal, a EDP, foi comprada por investidores chineses durante a crise da dívida, há três anos. A extravagante Three Gorges Group, propriedade do estado Chinês, adquiriu as ações do Estado Português no valor de 2,7 mil milhões de euros e prometeu investir uns adicionais 2 mil milhões de euros na EDP. Aqui, entram os 370 milhões gastos em Foz Tua.

“A barragem tornar-se-á uma atracão turística”, diz o gestor de projeto da EDP, Paulo Figueira, no meio do agitado local de construção. Guia-nos até ao túnel na encosta. A maquinaria da estação hidroeléctrica será instalada aqui, quase completamente escondida nas rochas, como resposta aos oponentes. O internacionalmente reconhecido arquiteto, Eduardo Souto de Moura, lidera o projeto desta construção.

“O reservatório da barragem atrairá pessoas para pescar e andar de barco. Estamos a ajudar a criar empregos”, acredita o gestor de projecto.

O gestor de projeto realça que as estações eléctricas são parte da região de vinho do Douro e que o rio está “domesticado” desde os anos 50. Foi possível restringir cheias e tornar o rio navegável de barco. No passado, apenas as embarcações para transporte de barris de vinho do Porto eram capazes de navegar pelo rio até à costa Atlântica.

Paulo Figueira não acredita que algo venha a parar o local de construção. Mas um pouco mais afastado do Rio Douro, o produtor de vinho João Roquette insiste que vai continuar a lutar.

“Uma barragem inacabada pode ser destruída com dinamite”, diz Roquette, membro da família a quem pertence a Herdade do Esporão.

Na visão de Roquette, o exemplo pode ser dado pelos Estados Unidos da América, onde empreendimentos hidroelétricos inúteis estão a ser demolidos. “Dentro de vinte anos, o Sol vai ajudar a produzir energia em Portugal a preços muito baixos. O que faremos então com estas barragens?”, questiona.

 

Pilvikki Kause (texto) e Milla von Konow (foto)

André Pataco e Plataforma Salvar o Tua (tradução)



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